Crônicas

O homem que não sonhava

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O Homem-Que-Não-Sonhava nasceu com suas raízes na falta de sonhos. O Homem-Que-Não-Sonhava foi criado com palavras quadradas e vazias. Ele nunca sonhou quando dormiu e nunca sonhou quando acordou. Talvez esse homem seja fruto de uma família que nunca deu suporte para incrementar sonhos e ambições. Nunca se sabe o que aconteceu com o seu pai e com os seus ancestrais, será que todos careciam de sonhos?

O Homem-Que-Não-Sonhava sabia exatamente o que tinha que fazer durante a vida, para ele foi dado um script com todos os tópicos que sua vida passaria. Seu pai sempre lia para ele quando era criança e não sabia ler o manual da vida dos homens sem sonhos. Um livro de três páginas com nenhum autor, nem posfácio ou prefácio, apenas o agradecimento por ter aquela vida e no corpo do texto estar escrito:

Regra nº1 dos homens que não sonhavam: jamais sonharas!

Regra nº2 dos homens que não sonhavam: aproveite a vida.

O dia a dia dos homens que não tinham sonhos era saber exatamente o que comer e beber, o que assistir, o que ouvir e quais piadas rir, era assim que aproveitavam a vida. A marca de tudo era a mesma, jamais ele trocou o tipo de cerveja que tomava. Ele nunca sonhou com o gosto de uma comida diferente que não fosse imposta a ele. Aquela paella deliciosa nunca esteve em suas expectativas. Para ele não era interessante burlar as regras dos homens que não sonhavam. Fazer isso era entrar em uma zona maior do que ele.

O Homem-Que-Não-Sonhava brincou com brinquedos que nunca foram trocados. Ele recebeu duas caixas de quebra-cabeça com 2.000 peças cada. Ele montou e desmontou centenas de vezes e nunca se perguntou se havia algo além desses brinquedos. Não sei se quebra-cabeça poderia ser chamado de brinquedo, muito menos para crianças.

Quando adulto já foi imposto um ofício para ele. Sua família inteira aconteceu a mesma coisa, todos nasceram e morreram fazendo a mesma coisa. Seu pai era alfaiate, seu tio carpinteiro, ele nasceu como contador. O avô teve seu destino como dentista por 100 anos e nunca pensou em outra coisa.


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A palavra que não entra na casa dos homens que não sonhavam: dúvida. Estava explicitamente proibido o uso dessa palavra por qualquer membro da família. A vida deles era perfeita para existirem dúvidas, dizia sua mãe. Em dois anos ele iria se casar com a Madalena, predestinada a ser sua esposa. Madalena, como o Homem-Que-Não-Sonhava, nasceu com seu script nas mãos e nunca ousou em conhecer outros mundos.

Dizem que o primo do Homem-Que-Não-Sonhava descobriu o outro lado da vida. Onde havia milhares de oportunidades e centenas de lugares diferentes. As pessoas eram todas misturadas. Não havia um script a ser seguido. Tudo era muito livre e colorido.

O Homem-Que-Não-Sonhava perguntou para seu pai o que aconteceu com ele. Ele desconversou e nunca mais entrou naquele assunto. Todos tinham repulsa em falar daquilo. O primo nunca mais apareceu nas festas de família dos homens que não sonhavam.

A piada entre os homens que não sonhavam era: “o que você sonhou hoje?” e sempre respondiam com alguma tonalidade de preto. “Eu sonhei com cinza escuro” ou “eu sonhei com um preto mais preto do que o próprio preto” e todos riam.

Não havia diálogo entre os homens que não sonhavam. Eles apenas existiam e se cumprimentavam. Um gesto de amor era quase a mesma coisa que ver unicórnios na cidade. Era uma sinfonia de “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite”, com uma pitada de piadas extremamente sem graças.

Durante uma tarde nublada, o Homem-Que-Não-Sonhava se deparou com um letreiro no bairro vizinho escrito “Entre, onde todos os seus sonhos se tornam realidade”. Aquela era a pior blasfêmia que ele poderia ler, mas o fez pensar no seu primo que ninguém falava sobre.

A primeira vez na sua vida que ele se questionou sobre não ter sonhos “Sonhar não deve ser tão viciante quanto dizem ser, cinco minutos nesse lugar não vai mudar minha vida”.

O Homem-Que-Não-Sonhava nunca mais foi visto por ninguém. Dizem as más línguas que ele se envolveu com coisas perigosas. Ahhh se as pessoas que falam isso soubessem onde ele está agora.


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Um dia ele sonhou
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